-SE ESPANHA QUER GIBRALTAR, QUANDO TENCIONA DEVOLVER OLIVENÇA ? -
E se tivesse sido ao contrário? E se a Espanha tivesse tomado um pedaço de território de alguém, forçado a nação derrotada a cedê-lo num tratado subsequente, e o mantivesse ligado a si? Comportar-se-ia Madrid como quer que a Grã-Bretanha se comporte em relação a Gilbraltar? Ni pensarlo!
Como é que eu posso estar tão certo disso? Exactamente porque existe um caso assim. Em 1801, a França e a Espanha, então aliadas, exigiram que Portugal abandonasse a sua amizade tradicional com a Inglaterra e fechasse os seus portos aos navios britânicos. Os portugueses recusaram firmemente, na sequência do que Bonaparte e os seus confederados espanhóis marcharam sobre o pequeno reino. Portugal foi vencido, e, pelo Tratado de Badajoz, obrigado a abandonar a cidade de Olivença, na margem esquerda do Guadiana.
Quando Bonaparte foi finalmente vencido, as Potências europeias reuniram-se no Congresso de Viena de Áustria para estabelecer um mapa lógico das fronteiras europeias. O Tratado daí saído exigiu um regresso à fronteira hispano-portuguesa (ou, se se preferir, Luso-espanhola) anterior a 1801. A Espanha, após alguma hesitação, finalmente assinou o mesmo em 1817. Mas nada fez para devolver Olivença. Pelo contrário, trabalhou arduamente para extirpar a cultura portuguesa na região, primeiro proibindo o ensino do Português, depois banindo abertamente o uso da língua.
Portugal nunca deixou de reclamar Olivença, apesar de não se ter movimentado para forçar esse resultado (ameaçou hipoteticamente com a ideia de ocupar a cidade durante a Guerra Civil de Espanha, mas finalmente recuou). Embora os mapas portugueses continuem a mostrar uma fronteira por marcar em Olivença, a disputa não tem sido colocada na ordem do dia no contexto das excelentes relações entre Lisboa e Madrid.
Agora vamos analizar os paralelismos em Gilbraltar. Gibraltar foi cedida à Grã-Bretanha pelo Tratado de Utrecht 91713), tal como Olivença foi cedida à Espanha pelo Tratado de Badajoz (1801). Em ambos os casos, o país derrotado pode reclamar com razões que assinou debaixo de coacção, mas é isto que acontece sempre em acordos de paz.
A Espanha protesta que algumas das disposições do tratado de Utrecht foram violadas; que Grã-Bretanha expandiu a fronteira para além do que fora estipulado primitivamente; que implementou uma legislação de auto-determinação local em Gilbraltar que abertamente é incompatível com a jurisdição britânica especificada pelo Tratado; e (ainda que este aspecto seja raramente citado) que fracassou por não conseguir evitar a instalação de Judeus e Muçulmanos no Rochedo. Com quanta muito mais força pode Portugal argumentar que o Tratado de Badajoz foi derrotado. Foi anulado em 1807 quando, em violação do que nele se estipulava, as tropas francesas e espanholas marcharam por Portugal adentro na Guerra Peninsular. Alguns anos mais tarde, foi ultrapassado pelo Tratado de Viena.
Certamente, a Espanha pode razoavelmente objectar que, apesar dos pequenos detalhes legais, a população de Olivença é leal à Coroa Espanhola.
Ainda que o problema nunca tenha passado pelo teste de um referendo, parece com certeza que a maioria dos residentes se sente feliz como está. A língua portuguesa quase morreu excepto entre os mais velhos. A cidade (Olivenza em espanhol) é a sede de um dos mais importantes festivais tauromáticos da época, atrai castas e matadores muito para além dos sonhos de qualquer pueblo de tamanho similar. A lei portuguesa significaria o fim da tourada de estilo espanhol e um regresso à obscuridade provinciana.
A reclamação do direito a Olivença (e a ceuta e Melilla), por parte de Espanha, assenta no argumento rudimentar de que as populações lá residentes querem ser espanholas.
Mas o mesmo princípio certamente se aplica a Gilbraltar, cujos habitantes, em 2002, votaram (17.900 votos contra 187 !!!) no sentido de permanecer debaixo de soberania bbritânica.
A Grã-Bretanha, a propósito, tem todo o direito de estabelecer conexões entre os dois litígios. A única razão por que os portugueses perderam Olivença foi porque honraram os termos da sua aliança connosco. Eles são os nossos mais antigos e confiáveis aliados, tendo lutado ao nosso lado durante 700 anos - mais recentemente, com custos terríveis, quando entraram na Primeira Guerra Mundial por causa da nossa segurança. O nosso Tratado de aliança e amizade de 1810 explicitamente compromete a Grã-Bretanha no sentido de trabalhar para a devolução de Olivença a Portugal.
A minha verdadeira intenção, todavia, é a de defender que estes problemas não devem prejudicar as boas relações entre os litigantes rivais.
Enquanto Portugal não mostra intenção de renunciar à sua reclamação formal em relação a Olivença, aceita que, enquanto as populações locais quiseram permanecer espanholas, não há forma de colocar o tema na ordem do dia. Não será muito de esperar que a Espanha tome uma atitude semelhante vis-a-vis Gibraltar.
Por Daniel Hanan
Tradução: C. Luna
Adaptação: Mano Belmonte
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E se tivesse sido ao contrário? E se a Espanha tivesse tomado um pedaço de território de alguém, forçado a nação derrotada a cedê-lo num tratado subsequente, e o mantivesse ligado a si? Comportar-se-ia Madrid como quer que a Grã-Bretanha se comporte em relação a Gilbraltar? Ni pensarlo!
Como é que eu posso estar tão certo disso? Exactamente porque existe um caso assim. Em 1801, a França e a Espanha, então aliadas, exigiram que Portugal abandonasse a sua amizade tradicional com a Inglaterra e fechasse os seus portos aos navios britânicos. Os portugueses recusaram firmemente, na sequência do que Bonaparte e os seus confederados espanhóis marcharam sobre o pequeno reino. Portugal foi vencido, e, pelo Tratado de Badajoz, obrigado a abandonar a cidade de Olivença, na margem esquerda do Guadiana.
Quando Bonaparte foi finalmente vencido, as Potências europeias reuniram-se no Congresso de Viena de Áustria para estabelecer um mapa lógico das fronteiras europeias. O Tratado daí saído exigiu um regresso à fronteira hispano-portuguesa (ou, se se preferir, Luso-espanhola) anterior a 1801. A Espanha, após alguma hesitação, finalmente assinou o mesmo em 1817. Mas nada fez para devolver Olivença. Pelo contrário, trabalhou arduamente para extirpar a cultura portuguesa na região, primeiro proibindo o ensino do Português, depois banindo abertamente o uso da língua.
Portugal nunca deixou de reclamar Olivença, apesar de não se ter movimentado para forçar esse resultado (ameaçou hipoteticamente com a ideia de ocupar a cidade durante a Guerra Civil de Espanha, mas finalmente recuou). Embora os mapas portugueses continuem a mostrar uma fronteira por marcar em Olivença, a disputa não tem sido colocada na ordem do dia no contexto das excelentes relações entre Lisboa e Madrid.
Agora vamos analizar os paralelismos em Gilbraltar. Gibraltar foi cedida à Grã-Bretanha pelo Tratado de Utrecht 91713), tal como Olivença foi cedida à Espanha pelo Tratado de Badajoz (1801). Em ambos os casos, o país derrotado pode reclamar com razões que assinou debaixo de coacção, mas é isto que acontece sempre em acordos de paz.
A Espanha protesta que algumas das disposições do tratado de Utrecht foram violadas; que Grã-Bretanha expandiu a fronteira para além do que fora estipulado primitivamente; que implementou uma legislação de auto-determinação local em Gilbraltar que abertamente é incompatível com a jurisdição britânica especificada pelo Tratado; e (ainda que este aspecto seja raramente citado) que fracassou por não conseguir evitar a instalação de Judeus e Muçulmanos no Rochedo. Com quanta muito mais força pode Portugal argumentar que o Tratado de Badajoz foi derrotado. Foi anulado em 1807 quando, em violação do que nele se estipulava, as tropas francesas e espanholas marcharam por Portugal adentro na Guerra Peninsular. Alguns anos mais tarde, foi ultrapassado pelo Tratado de Viena.
Certamente, a Espanha pode razoavelmente objectar que, apesar dos pequenos detalhes legais, a população de Olivença é leal à Coroa Espanhola.
Ainda que o problema nunca tenha passado pelo teste de um referendo, parece com certeza que a maioria dos residentes se sente feliz como está. A língua portuguesa quase morreu excepto entre os mais velhos. A cidade (Olivenza em espanhol) é a sede de um dos mais importantes festivais tauromáticos da época, atrai castas e matadores muito para além dos sonhos de qualquer pueblo de tamanho similar. A lei portuguesa significaria o fim da tourada de estilo espanhol e um regresso à obscuridade provinciana.
A reclamação do direito a Olivença (e a ceuta e Melilla), por parte de Espanha, assenta no argumento rudimentar de que as populações lá residentes querem ser espanholas.
Mas o mesmo princípio certamente se aplica a Gilbraltar, cujos habitantes, em 2002, votaram (17.900 votos contra 187 !!!) no sentido de permanecer debaixo de soberania bbritânica.
A Grã-Bretanha, a propósito, tem todo o direito de estabelecer conexões entre os dois litígios. A única razão por que os portugueses perderam Olivença foi porque honraram os termos da sua aliança connosco. Eles são os nossos mais antigos e confiáveis aliados, tendo lutado ao nosso lado durante 700 anos - mais recentemente, com custos terríveis, quando entraram na Primeira Guerra Mundial por causa da nossa segurança. O nosso Tratado de aliança e amizade de 1810 explicitamente compromete a Grã-Bretanha no sentido de trabalhar para a devolução de Olivença a Portugal.
A minha verdadeira intenção, todavia, é a de defender que estes problemas não devem prejudicar as boas relações entre os litigantes rivais.
Enquanto Portugal não mostra intenção de renunciar à sua reclamação formal em relação a Olivença, aceita que, enquanto as populações locais quiseram permanecer espanholas, não há forma de colocar o tema na ordem do dia. Não será muito de esperar que a Espanha tome uma atitude semelhante vis-a-vis Gibraltar.
Por Daniel Hanan
Tradução: C. Luna
Adaptação: Mano Belmonte
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