A tagarelice vazia, os diálogos paupérrimos sem sentido algum, têm vindo a invadir, todos os dias, o nosso quotidiano. A palavra do homem actual, perdeu o valor primordial que, nas remotas origens do mito, lhe era reservado. "O homem mítico sabia estar mais perto dos deuses. Por isso, não banalizou a palavra. Aprendeu a celebrar com ela o precioso ritual que o ascendia ao mais Além". O homem actual fala, mas a sua palavra é "balôfa", é vazia, despida, perdeu a força do imaginário criador, a aproximidade do Real, a significação do Simbólico, enfim, o peso da verdade. Os diálogos de hoje, são maçudos, primários, aborrecem, não aprendemos nada com eles. Não valem nada, não passam de "balelas" relacionadas com o futebol, com a crise, com o dinheiro, perdeu o interesse, a adesão ao simbólico (mundo das trocas da comunicação inter-humana) e a referência ao Real. Cada homem fala a fala do mundo...Hoje a sua fala é fantasia pura, é...NADA! Por isso, as palavras que num certo agora parecem facas ou setas afiadas, num breve amanhã, serão esterilmente inofensivas. Assiste-se com a mesma indeferença ao espectáculo da telenovela, como da guerra ou da tragédia provocada por um tremor de terra, da fome...como um desafio de futebol...Tudo é real da mesma forma, tudo está longínquo de mais para que o peso da verdade, do drama, nos toque. Os sentimentos, as saudades, a ética, o respeito pelos nossos semelhantes, pelas nossas crianças, estão-se a diluir, estão-se a perder na sua diferenciação engendrante da verdade e do sentido.
Talvez, para o homem actual, a guerra e a paz sejam a mesma coisa, talvez matar e curar se confundam na mesma representação de formas vazias. As palavras vazias que o homem fala - quer falem da guerra, da paz, do futebol, do passado, do futuro ou do amor - são sempre fuga do mundo e das pessoas, são sempre algo que está longe de mais, são sempre reais do mesmo modo. Que importa que a palavra arremesse as suas setas, empunhe as suas facas, se se julgar que tudo é uma disfarçada fantasia? Se se acreditar que tudo está demasiado afastado de nós? Poucos dias, poucas horas, bastarão para adormecer um qualquer escândalo, que ao rebentar, parecia abalar o mundo inteiro. Tudo é uma simples questão de um "pouco de tempo" e o espectáculo perderá o seu impacto.
A fronteira entre a fantasia e a realidade nunca esteve tão arrastada, deluída. Só serve para vender, para fazer face à concorrência e, nada mais!
A palavra actual, que tão docemente a memória adormece, perdeu o seu valor, porque deixou de ser a oração íntima com que nos reencontramos, porque deixou de ser a ponte com que nos descentramos até à alteridade radical do outro, até à dimensão do encontro interpessoal, e mata também o regresso ao mundo, o que resta dessa palavra de fantasia, também já não serve para criar ou para voar. O poeta e o pensador de hoje, sofrem na carne esta alienação, este vazio da palavra.
Cada vez lhes é mais difícil reencontrar as formas de futuro que o tempo seja incapaz de devorar.
A palavra de fantasia, fora do mundo, fora das pessoas e fora do Além, desenha a negatividade atroz de um enigmático inferno, queimando a possibilidade de se nascer nas múltiplas vidas que a Vida virtualiza.
CRUZ DOS SANTOS
Coimbra/Portugal
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Coimbra/Portugal
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