Gaivotas em terra, tempestade no mar, velho ditado português que, de tantos em tantos anos, os portugueses expatriados verificam ser verdadeiro e sempre actual.
Assim que em Portugal há barafunda, e pelo meio se metem eleições, os impropriamente chamados deputados pela emigração desatam a ter saudades dos emigrantes, e ei-los que, com a mochila bem fornecida de demogogia e descaramento, aterram cá pelas comunidades lusas às revoadas. Prometem tudo, até a camisa do corpo, e juram tudo nem que seja pela alma da mãe. Tal qual como o conto do vigário, há sempre uns quantos distraídos que embarcam na marosca. E é assim que os deputados vão sendo eleitos, contra uma abstenção crónica e aterradora. Mal o são, ala que se faz tarde, viram costas à chatice da emigração e vão gozar o bem-bom daquelas horas refasteladas na Assembleia da República, devidamente cortadas por almoçaradas, jantaradas, negócios, engates, viagens de borla e, acima de tudo, a certeza reconfortante de, após uns anos tão atarefados, receberem uma pensão de reforma que muitos portugueses, depois de terem tido uma vida de trabalho insano, gostariam de receber uma vez por ano. Em Lisboa é que é bom...
Posto isto, tenho a dizer-vos que essas aves de arribação já começaram a aparecer. Ainda há poucas semanas aí esteve Manuela Aguiar, que depois de repetir a secretaria de estado das Comunidades e o cargo de deputada por uns anos, ficou conhecida entre os maldizentes dos emigrantes por Manuela Avoar. A criatura não parava. E mesmo reformada, continua a voar. desta vez, aterrou num apontamento teatral do grupo Mulheres Portuguesas 55+, da St Christopher House, que teve lugar no consulado, fazendo saber que, como tinha estado em Montréal numa reunião de mulheres, resolveu dar uma saltada a Toronto.
Grande coincidência. Durante o ano, e anos, não se lembram os políticos da St Christopher House e de outras instituições de amor ao próximo, a que tantos portugueses recorrem, mas em havendo eleições, colam-se logo. Tentam partidarizar tudo. E ficar bem no retrato.
Mais vos digo que vem aí o Xuzé Xejário, esse castiço que, quando secretário de estado, trazia para aí cestas cheias de condecorações, e até havia quem lhe chamasse o Ti Zé das Medalhas. Homem de vistas largas, aproveitou um tonto dum padre a sul do Ontário que, em troca de promessa formal de vir a ser deputado da emigração, transformou a igreja dos portugueses em sede do PSD. Mas como os bispos canadianos são outra loiça, deu-se mal com a cowboyada e foi tranferido lá mais para o interior com as orelhas a arder. O respeitinho é muito bonito.
Foi sempre isto pelos anos fora. Quando cheguei ao Canadá, até havia pândegos do CDS à semana e do PSD aos domingos. Pulavam dum partido para o outro consoante os sujeitos que vinham de Lisboa lhes satisfizessem ou não os pedidos. Havia até um que prometia porrada "se não votais PSD".
Com estas e outras, o PSD delapidou os 20 anos em que esteve instalado no Canadá, tendo sido substancial em descrédito o comportamento de vários militantes seus.
Valha a verdade que o PS também falhou quando, finalmente, foi eleito neste país. O secretário de estado das Comunidades por esse partido, José Lello, começou menos mal e as pessoas acreditaram que ele ia ser assim até ao final do mandato. Mas borrou a pintura toda com o representante local que escolheu e, nas últimas eleições, foi de uma deslealdade absoluta em relação ao candidato a deputado por este círculo, o funcionário consular Gonçalo Martins, um homem correcto que teve por maior pecado a sua ingenuidade, o seu excesso de boa fé. Tudo para ser ministro já nem sabemos de quê. Mais tarde, chegaram ao nosso conhecimento outras deslealdades e tratantadas, mas isso são contos largos que ficam para qualquer dia. temos, pois, que o PS também não foi flor que se cheire na emigração.
Tudo isto acontece porque o estado português não tem respeito nem apreço pelos emigrantes, embora diga o contrário. Se respeitasse e apreciasse, organizava o mapa eleitoral de modo a que os deputados da emigração fossem escolhidos por nós, cá fora. No parlamento haveria uma representação digna dos portugueses expatriados, e não uma representação pindérica de aves de torna viagem. Mas não é nem será o caso, porque é absolutamente claro o que o estado português quer dos emigrantes: as remessas de dinheiro e os votos que perpetuem o tacho dos que fizeram da política a sua profissão, o seu emprego.
Fernanda Leitão
Toronto-Canadá
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