Era sempre assim. Quando a música baixava e os apelos do pastor deixavam de se ouvir, os fiéis levantavam os joelhos do chão para depositar o dinheiro no altar. Lá fora, as dúvidas permaneciam.
Durante 32 anos. a Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) rejeitou todas as suspeitas de corrupção, mas elas nunca desapareceram. Agora colaram-se à instituição para sempre. O Ministério Público de São Paulo acusou o fundador, Edir Macedo, e outros nove membros de associação criminosa e lavagem de dinheiro.
As três décadas de história da IURD contam-se com somas milionárias, multidões de fiéis, discursos inflamados e, sobretudo, suspeitas. Logo em 1977, uma inspecção da Receita Federal sugere que a igreja deve perder a imunidade fiscal porque está a ser usada para ganhar dinheiro - segundo a Constituição do país, o património e as fontes de rendimento das igrejas só podem ser utilizados para actividades religiosas e nunca para a obtenção de lucro. Uma década depois, a mesma instituição elabora um estudo para regulamentar as doações de dinheiro relacionadas com a fé. A proposta nunca foi aprovada.
O VÍDEO DO DÍZIMO - Outras dúvidas são levantadas quando, em 1995, Edir Macedo surge num vídeo a ensinar aos pastores como pedir dinheiro aos crentes. "Se você se mostrar chocho, o povo não confia em você. Você tem de falar como se fosse o super-herói do povo. Peça, peça...Se houver alguém que não dê, há um montão que vai dar", explicava com uma exuberente coreografia de braços.
Desde que o vídeo foi divulgado, a instituição foi exaustivamente investigada, mas pouquíssimas irregularidades ficaram provadas nos dez processos que foram instaurados.
O Código Penal brasileiro não inclui práticas religiosas. Se alguém quiser doar todo o seu património à igreja, tem toda a liberdade para o fazer. Assim, para condenar os líderes da igraja, um objectivo era fundamental: provar que o dinheiro doado estava a enriquecer os líderes da igreja e não a financiar obras de caridade.
Era preciso descobrir o percurso do dinheiro desde que saía dos bolsos dos crentes até ser usado para pagar a construção de uma mansão de 6000 m2 (como a construída por Edir Macedo em 2007). É isto que, após dois anos de investigação, os procuradores acabam de conseguir. Entre 2001 e 2008, a IURD recebeu mais de 3 mil milhões de euros doados pelos seus 8 milhões de seguidores. Metade do dinheiro foi colocado na caixa do dízimo dos templos, a outra metade chegou através de 4015 transferências bancárias. Nenhum deste dinheiro pagou impostos.
EMPRESAS FANTASMA - Alguns destes milhões foram depois utilizados em pagamentos a duas empresas-fantasma: a Cremo Empreendimentos e a Unimetro Empreendimentos. Só em 2004 e 2005, estas empresas ( que não emprestam um único serviço) movimentaram 27 milhões de euros, garantiu à revista "Veja" fonte da Secretaria da Fazenda.
A paragem seguinte destes milhões eram duas empresas sedeadas em paraísos fiscais nas ilhas Caimão e nas do Canal ( a Investholding e a Cableinvest). Sob a forma de empréstimos a executivos da IURD, o capital regressava depois à terra natal para ser aplicado na compra de aviões particulares ( como um Cessna de 1 milhão de euros), mansões ou para ser investido no império que a igreja construiu na comunicação social - 22 canais de televisão e 42 estações de rádio
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