A Xenofilia
O que é a xenofilia? É a simpatia por tudo quanto é estrangeiro e a mim parece-me que ela está na massa do sangue dos portugueses, como a saudade e o fado.
Este gosto que vem de fora prega, às vezes, boas partidas. Um senhor de gosto muito requintado só usava fatos feitos com fazendas inglesas; um dia com grande surpresa e não pouca irritação, viu gravada na ourela: 'Made in Covilhã'; uma senhora só usava sapatos comprados em Espanha, até ao dia em que uma palmilha descolada deixou ler: 'Made in S. João da Madeira'; um casal de viagem pelos EUA encontrou um tapete muito fora do vulgar o que os fez exclamar: só os americanos são capazes de tal coisa. Qual não foi o seu espanto quando ao olhar o avesso do tapete leram 'Made in Portugal'.
E no turismo? Não conhecem o Convento de Cristo em Tomar, ou o Templo de Diana em Évora, mas já foram à Grécia; não conhecem as bonitas Grutas de Mira d'Aire, perto de Fâtima, mas conhecem as Grutas de Betharram perto de Lourdes; não conhecem nenhum dos magestosos castelos de Portugal, mas já visitaram os de Loire, que em minha opinião não lhes chegam aos calcanhares.
E na gastronomia? Vamos tomar uma refeição fora de casa e apresentam-nos o 'menu', isto é, a ementa, em três línguas, o que é louvável para ajudar os estrangeiros; mas já me dá vontade de rir ver o nome dos pratos, em inglês ou francês e ao perguntar ao empregado como é feito determinado prato, ouvir como resposta: isso é 'bacalhau à Zé do Pipo'. As tortas são 'tartes'; os vinhos da Bairrada ou do Dão têm rótulos em francês ou inglês e só quem é perito é que sabe que eles são bem portugueses; a massa é 'sphagetti'; os pasteis ou bolinhos de carne, a manteiga e o pão que ajudam a esperar o atendimento são 'couvert'.
Uma sala de diversão é um 'pub'; onde se come uma refeição ligeira é um 'snack'; onde cada um se serve é um 'self'; um autocarro de viagem é um 'autopullman'; um Centro Comercial é um 'shopping', etc.
A nossa língua é falada nos quatro cantos do mundo, mas com tanto estrangeirismo, qualquer ficamos todos como os emigrantes que vêm a férias: o bilhete de comboio é 'ticket'; a mala de viagem é 'valise'; a refeição é 'repas' e obrigada é 'merci' ou 'bye-bye'.
Eu não tenho nada contra os estrangeiros e os seus produtos, mas faz-me pena ver o abandono a que é votada a nossa língua na música então é um exagero. Os nossos artistas, nos programas de variedades, só sabem cantar em inglês esquecendo que a nosso língua é das mais suaves. E o que mais lamento é que com o desenvolvimento dos computadores, telemóveis e internet, as nossas crianças cada vez se afeiçoam menos ao português, pois a terminologia aí utilizada é toda inglesa.
Maria Fernanda Barroca
(J.R.L.)
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